Pestalozzi: Um estudo acadêmico

Pestalozzi “O educador da Humanidade"

Contexto histórico e principais obras.

Johann Heinrich Pestalozzi nasceu em Zurich, Suíça, no ano de 1746. Órfão de pai aos 5 anos, passou por grandes dificuldades econômicas, juntamente com sua mãe seus três irmãos. Fato este que ajudou a consolidar sua personalidade predominantemente humanista, tornando-o um homem sensível e sonhador, sempre preocupado com o destino dos necessitados. Pestalozzi foi criado juntamente com seus irmãos, por sua mãe Susanne Hotz e a governanta Magda B. Schmid. Ainda estudante, já demonstrava interesse pela causa dos desamparados, participando sempre de movimentos de reforma política e social.

Em 1774, na esteira de seu pioneirismo, fundou um orfanato na cidade de Neuhof, onde tinha a intenção de ensinar técnica de agricultura e comércio, tentativa que fracassou alguns anos depois. Resolveu, então, transformar o projeto agrícola fracassado em um Instituto Filantrópico para crianças abandonadas, no que também não teve sucesso. Porém, nunca desistiu de seus objetivos. No ano de 1780 publica “Crepúsculos de um emérita”, obra que reflete sobre sua visão do ser humano.

Durante a Invasão Napoleônica, em 1798, quando a cidade de Stans foi invadida e seus habitantes massacrados pelas tropas, Pestalozzi reuniu as crianças desamparadas e passou a cuidar delas em meio às mais precárias condições. Claramente influenciado pelas idéias de Jean Jacques-Rousseau, acreditava na educação como um desenvolvimento total do indivíduo, num conjunto moral, intelectual e físico, cuja potencialidade se encontra na criança, que deve ser estimulada, principalmente no lar em que vive: "A escola deve ser a continuação do lar. É no lar que se encontra o fundamento de toda cultura verdadeiramente humana e social" – concluía o educador.

Pestalozzi acreditava que o indivíduo, desde criança, possui todos os meios necessários para a socialização plena e que o papel do educador é justamente promover o desenvolvimento desses valores já existentes em cada indivíduo, sempre ressaltando a importância da família na formação da personalidade. Para ele, a mãe é a figura central do desenvolvimento educacional. E ele entendia que o conhecimento não é propriamente adquirido, mas sim desenvolvido, pois cada ser humano já nasce com a tendência espontânea da natureza de seu próprio desenvolvimento. Somente precisa do estímulo do educador, sempre subordinado à educação moral e espiritual.
Em 1805, Pestalozzi fundou o famoso Internato de Yverdon, cujas atividades principais eram desenho, escrita, canto, educação física, modelagem, cartografia e excursões ao ar livre. Durante os 20 anos de funcionamento, a escola foi freqüentada por estudantes de vários países europeus. Tal Instituto, devido à sua popularidade, ganhou renome internacional.

O espiritismo trouxe grandes influências das idéias de Pestalozzi, principalmente no que diz respeito à importância do lar como base para a educação espiritual e para a formação da personalidade do indivíduo. A didática de Pestalozzi preceitua que "[...] a melhor escola ainda é o lar, onde a criatura deve receber as bases do sentimento e do caráter" e que "[...] a universidade pode fazer o cidadão, mas somente o lar pode edificar o homem".

Em 1825, devido a disputas internas, foi obrigado a encerrar suas atividades no Instituto de Yverdon, o que lhe causou enorme tristeza. Dotado de vasta cultura, em 1781, publicou um romance em quatro volumes, intitulado "Leonardo e Gertrude", muito divulgado, onde expunha suas idéias de reforma social e política. O livro conta a história de Gertrudes, uma mulher generosa, dotada de bondade e inteligência infinitas. Sua dedicação aos filhos era tamanha que, além de tirar seu marido Leonardo do vício da embriaguez, conseguiu influenciar os habitantes da aldeia onde morava: fez com que todos aplicassem seus métodos em benefício da população, alcançando o bem estar social tão almejado por Pestalozzi, que acreditava plenamente possível realizar na prática, o conteúdo de sua obra. Johann Heinrich Pestalozzi casou-se com Ana Schultz, companheira amiga e fiel, que lhe deu o filho Jacob, falecido ainda jovem. Jacob, porém, deixou-lhe o neto Gottlieb, que permaneceu ao lado do avô até os últimos dias deste, quando, acometido de grave doença, veio a desencarnar em 17 de fevereiro de 1827.

Influências, princípios e metodologia

Dentre as influências dentro da obra de Pestalozzi podemos destacar o papel do filosofo iluminista Jean Jacques Rousseau, considerado o “pai da pedagogia moderna”. Rousseau foi um filósofo suíço, escritor, teórico político e um compositor musical autodidata. Uma das figuras marcantes do Iluminismo francês.

O princípio fundamental de toda a obra de Rousseau, pelo qual ela é definida até os dias atuais, é que o homem é bom por natureza, mas está submetido à influência corruptora da sociedade. Em sua obra sobre educação, o pensador suíço prega o retorno à natureza e o respeito ao desenvolvimento físico e cognitivo da criança.
Estas idéias aparecem com intensidade dentro da obra de Pestalozzi. Entretanto há aspectos divergentes entre esses teóricos o que nos mostra que Pestalozzi não só continua o trabalho daquele que foi seu mestre, como também avançou e propôs inovações.
Ao contrário de Rousseau, cuja teoria é idealizada, Pestalozzi, segundo a educadora Dora Incontri, "experimentava sua teoria e tirava a teoria da prática", nas várias escolas que criou. Pestalozzi aplicou em classe seu princípio da educação integral — isto é, não limitada à absorção de informações. Segundo ele, o processo educativo deveria englobar três dimensões humanas, identificadas com a cabeça, a mão e o coração.

Nos textos lidos, e autores consultados não há menções significativas a outros autores, os quais poderiam ter contribuído expressivamente para a construção do pensamento pestalozziano. Temos sim, a atribuição de algumas correntes teóricas, como sendo forte influenciadoras dentro das proposições de Pestalozzi, tais como:

O Idealismo, o iluminismo e a moral protestante. Sendo assim, esporemos algumas das principais características de cada corrente teórica.

O Idealismo:

O Idealismo é uma corrente filosófica que emergiu apenas com o advento da modernidade, uma vez que a posição central da subjetividade é fundamental. Tendo suas origens a partir da revolução filosófica iniciada por Descartes e o seu cogito, é nos pensadores alemães que o Idealismo está em geral associado, desde Kant até Hegel, que seria talvez o último grande idealista da modernidade. O postulado básico é que Eu sou Eu, no sentido de que o Eu é objeto para mim (Eu). Ou seja, a velha oposição entre sujeito e objeto se revela no idealismo como incidente no interior do próprio eu, uma vez que o próprio Eu é o objeto para o sujeito (Eu). Segundo Incontre, não se pode afirmar que Pestalozzi, não se deixou guiar totalmente pelo idealismo alemão, para ela “apreender Pstalozzi como idealista é faze-lo filho de si mesmo. Para Icontre o autor é uma ponte entre os dois momentos históricos, é transição entre o iluminismo e o idealismo”.

Iluminismo:
Foi um movimento e uma revolta intelectual ao mesmo tempo surgido na segunda metade do século XVIII. Enfatizava a razão e a ciência como formas de explicar universo. Foi uma linha filosófica caracterizada pelo empenho de entender a crítica e o guia da razão em todos os campos da existência humana, cujas principais características são Características: empirismo, idéias políticas progressistas, deísmo e sensualismo pedagógico.

Para Incontri “Pestalozzi foi sempre um iluminista, na medida na medida em que calculava tão prosaicamente o desenvolvimento do homem, quando abordava racionalmente a gratidão, a amabilidade e outros tipos de conhecimento”.
Moral Protestante:

Pestalozzi irá utilizar as suas crenças e de seus valores para poder transformar a educação em um verdadeiro ato de amor. Ele fundou várias escolas e nelas aplicou a educação integral e aboliu provas, notas, castigos e recompensas transformando a instituição em algo construtor de saber e laços afetivos por isso se diz que “a disciplina exterior, na escola de Pestalozzi, era substituída pelo cultivo da disciplina interior, essencial à moral protestante”. (ARCE,2002).
As influências supra citadas se constituem então, na base dos princípios educacionais da teoria pedagógica de Pestalozzi. Para este teórico a educação deveria formar o homem de forma integral e deveria ser estabelecida através da moralização do corpo, da mente e das mãos (fazendo alusão ao trabalho), e deveria
começar com a percepção de objetos concretos.

Pestalozzi acreditava na educação como um desenvolvimento total do indivíduo, num conjunto moral, intelectual e físico, cuja potencialidade se encontrava na criança, que deve ser estimulada, principalmente no lar em que se vive. Para este teórico, a escola deve ser a continuação do lar. Além disso, afirma que a mãe é figura central do desenvolvimento educacional.
Pestalozzi entendia que o conhecimento não é propriamente adquirido, mas sim desenvolvido, só precisa do estímulo do educador. Ele incentiva a formação de professores, ressaltando que as relações entre esse e o aluno devem ser baseados e reguladas pelo amor. Para o filósofo suíço, um dos cuidados principais que o educador deveria ter é, saber respeitar os estágios de desenvolvimento pelos quais a criança passa, ou seja, aceitar que o indivíduo se desenvolve gradativamente, respeitando assim, seu tempo. Dessa forma podemos dizer que Pestalozzi “psicologizou a educação”.

Em uma época onde o acesso a educação era restrito, o teorio defendia ideias que caminhavam rumo a “universalização da educação”. Ele acreditava que todos deviam ter acesso a ela, pois a educação é o meio para o aperfeiçoamento individual e social do sujeito. De acordo com Pestalozzi a renovação da educação seria a verdadeira questão social, propondo sempre o desenvolvimento de uma educação pública, onde essa se colocaria como um direto absoluto a todos os indivíduos.

Metodologia:
Pestlalozzi é conhecido e considerado por muitos autores como a construtor de um método, o método intuitivo. Segundo os postulados deste método o meio essencial da educação intelectual é a intuição. Para Pestalozzi, a intuição não se limitava à mera visão passiva dos objetos, à contemplação das coisas, mas incluía a atividade intelectual por meio da qual eram criados os objetos.
Conforme Pestalozzi (1946, p.15): “O conhecimento pode ser manifestado de maneira elementar pelo número, pela forma e pela palavra, que são produtos da inteligência criados por intuições maduras e que devem ser considerados como meios para a progressiva precisão de nossos conceitos”.
De acordo com o método intuitivo, a criança parte da observação de um objeto, pelos sentidos alimenta a intuição (mente) de conteúdos, permitindo a construção de hipóteses, ou seja, a produção de conhecimento.

Para Dora Incontri é uma injustiça a acepção que se faz de que Pestalozzi foi apenas o criador de um método: o intuitivo. Segundo essa autora:
“Conhecer Pestalozzi apenas como o criador de um método é conhecer a casca de seu pensamento, pois é concebe-lo apenas como uma práxis pedagógica, ignorando que ele está intimamente embasado numa filosofia da educação”.(Incontri, 1996, p.65).
Pestalozzi usa ao mesmo a observação empírica dos fatos e a intuição global. Para ele deve-se aprender com a realidade dando valor ao objeto, mas participando subjetiva e emocionalmente da construção do conhecimento.
Para compreender Pestalozzi e seu método é preciso ao tempo, um forte espírito analítico e uma forte intuição. Análise e intuição são então dois pressupostos do método.
É preciso ter disposição afetiva para entender Pestalozzi. O conceito, para ele é importante, mas é preciso ir além e apreender factualmente o conceito. Segundo ele, a intuição é muito importante neste processo.

Contribuições para a área pedagógica:
ABC da intuição

ARCE em seu livro diz que Pestalozzi ao observar e procurar aprender com as leis físicas da natureza foi que encontrou o que realmente a educação necessita para ser útil ao homem. Uma das observações que realizou, neste sentido, diz respeito à aquisição da linguagem pela criança. Pestalozzi através desta observação, chega a uma forma que considera natural de ensinar a criança a adquirir a escrita, a esta metodologia ele chamou de ABC da intuição.
O educador, segundo a autora, acrescentou ao ensino da leitura o desenho, por ser a representação escrita primeira que a criança faz do mundo que a cerca. Assim consolidou um importante princípio, o de que em seu desenvolvimento a criança passa de noções a princípio confusas para noções claras; suas intuições sobre os objetos vão amadurecendo a medida que ela vai se desenvolvendo, e esta é a forma original e natural de o homem desenvolver seu intelecto.
A princípio as instituições da criança são confusas e se reduzem a sons isolados, as crianças são confusas e se reduzem a sons isolados, a criança vai gradativamente identificando estes sons, formando palavras, até chegar ao ponto em que é capaz de comunicar-se perfeitamente, e isso ocorre graças à sua inserção na vida cotidiana, junto das pessoas que lhe são próximas. Vivendo, naturalmente a criança aprende a linguagem oral e a desenvolve. Com a língua escrita, deveria ocorrer o mesmo, ao contrário do que se faz, tentando incultir-lhe frases e palavras que ela acaba por decorar e que se transformam em uma tortura para a criança.
Primeiro a criança procura representar através do desenho a sua linguagem e o mundo físico que a cerca, gradualmente a criança deve tomar contato coma linguagem escrita e assim sentirá necessidade de conhece-la. As letras através de sons serão as primeiras coisas que deverá aprender, passando então para sílabas, palavras e por fim, frases inteiras. Não deve esquecer que tudo estão deve ocorrer trabalhando com os objetos que fazem parte do cotidiano da criança.
ARCE diz que, além de atrelar a educação ao desenvolvimento natural do ser humano, Pestalozzi também atrela aos sentidos: “como ser vivo, fisicamente não és outra que teus cinco sentidos”. Portanto, tudo o que passa pelos sentidos se constitui em conhecimento para o homem, a educação deve trabalhar com eles, que levam o homem a conhecer a si mesmo.
Pestalozzi diz que a tríade número, forma e a linguagem constituem conjuntamente os meios elementares do ensino.
O ABC da intuição de Pestalozzi recebe este nome, por congregar todo o método de orientação da criança no processo de conhecer-se, de descobrir-se e de conhecer o mundo que a cerca, através dos sentidos.

ABC das atitudes:

Segundo ARCE, Pestalozzi, na busca de um método que unisse todas as partes do homem, que trabalhasse em sua totalidade, sem negligenciar sua origem e seus fins, chega a cinco atitudes que devem preceder à utilização ou criação de qualquer método. Primeiro tornar-se mais claras as intuições que o indivíduo possui a respeito do mundo. Isso significa partir do mais simples para o mais complexo, aproveitando-se dos conhecimentos que o indivíduo já possui e acrescentando a estes outros; segunda - a arte de educar deve estar subordinada as impressões que a natureza e a realidade deixam para o indivíduo; terceira - a educação deve se ocupar dos mecanismos físicos dos objetos, através dos sentidos; quarta – elege algo da natureza já realiza ao reunir sobre seu império elementos heterogêneos e harmonizá-los: a educação deve fazer o mesmo, acabando com a homogeneização que marca sua metodologia; quinta – pestalozzi chama a atenção para a riqueza e a multiplicidade da produção da natureza graças à liberdade e à independência que nela imperam: a educação deve buscar o mesmo, sendo que, para tanto deve saber observar no particular o heterogêneo, que Sá se revela quando existe liberdade.
A autora diz que com o ABC da intuição e o ABC das atitudes, Pestalozzi acreditava estar proporcionando a educação integral do homem, que era o objetivo último de toda a sua metodologia: criar indivíduos que vivessem em harmonia perfeita com Deus e a natureza, bem como em harmonia com os outros seres humanos.

(IN)Conclusões:

Quando nos referimos ao pensamento pedagógico elaborado durante o século XVIII não podemos deixar de direcionar nosso pensamento à obra deste grande teórico. Pestalozzi foi um pensador a frente do seu tempo, respeitado pelo estado e acreditado por seus colaboradores. A obra deste autor certamente está entre as mais atuais e contemporâneas, suas idéias permeiam as praticas escolares na atualidade e os recursos pedagógicos por ele criados, como a lousa e o lápis estão presentes na maioria, senão em todas as escolas brasileiras. Para Pestalozzi a educação estava além da escolarização. Para ele educar era formar o sujeito integral, bom e moralizado. Segundo Dora Incontri a educação deveria seguir a tríade : moral do corpo, da mente e do espírito. A criança deveria ser educada com amor e afeto. O professor seria assim, um cultivador, um jardineiro que iria cuidar desses três aspectos fundamentais da criança. As relações na escola deveriam ser calcadas no respeito e na não hierarquização dos espaços escolares. O intuito da educação pestalozziana seria dessa forma, formar o ser humano integral para a vida.

Referências:

ARCE, Alessandra. A pedagogia na “Era das Revoluções”:uma análise do pensamento de Pestalozzi e Froebel. Campinas: Autores Associados, 2002.

INCONTRI, Dora. Pestalozzi, Educação e ética. São Paulo, Scipione, 1996.

ZANATTA, Beatriz Aparecida. O método intuitivo e a percepção sensorial como legado de Pestalozzi para a geografia escolar. Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 66, p. 165-184, maio/ago. 2005